CRÔNICAS DO COTIDIANO DE UM PROFESSOR: CRÔNICA DE UM RELÓGIO QUE NUNCA PARA.

11:43 Professor José Luiz 0 Comments

O relógio não mente. Ele marca, impiedoso, o compasso da existência. Tique-taque, tique-taque — e lá se vai mais um minuto, mais uma hora, mais um dia que não volta nunca mais. Enquanto você lê estas palavras, o ponteiro avança, devorando o futuro e transformando-o em passado. E você, distraído na correria do cotidiano, nem percebe que está, a cada instante, mais perto do último segundo, do ultimo movimento do ponteiro menor.

As aulas têm 50 minutos. Tem aqueles que ficam contando os segundos – alunos e professores – para deixarem as salas, pois para eles ali é deserto árido e infértil, gerador de sofrimentos, terreno repleto de tristezas e frustrações. A mim, como professor que crê na poesia – por vezes dura e implacável – da educação, nunca me acometeu esse inglório sentimento, pois nunca me ative ao relógio; sempre fui alertado pelo susto da sirene escandalosa. Os dias vão passar de seu modo inexorável, impiedoso, não há jeito, nem nada capaz de o deter. Assim, como “passar de ano” significa bem mais que simplesmente ser aprovado no fim do ano letivo, é carregar as histórias vividas para ser um pouco melhor no tempo que há de chegar, vamos seguindo o comboio.

Quantas vezes, ao longo da vida, olhamos para o relógio com pressa? "Que horas são?" — perguntamos, ansiosos, como se o tempo fosse um inimigo a ser derrotado. Mas ele não é. Ele é simplesmente o rio que nos carrega, sem perguntar nossas vontades, rumo ao mar. E nós, frágeis passageiros, agarramo-nos a troncos ilusórios — planos, promessas, esperanças —, tentando adiar o inevitável. 

Lembro-me de quando era criança e o tempo era um aliado. Os dias eram longos, as tardes infinitas, e o ponteiro do relógio da sala parecia dormitar, preguiçoso. Hoje, os ponteiros correm. Correm como se tivessem pressa de chegar a um destino do qual eu, francamente, não quero nem saber. 

Mas eis a beleza da coisa: enquanto o relógio avança, nós ainda estamos aqui. Respirando. Sentindo. Amando. Sofrendo, sim, mas também rindo — e quanta graça há num simples riso! Quantas histórias cabem num só dia! A vida, essa mestra insensível, não para. Ela nos empurra para frente, mesmo quando queremos ficar parados. 

Por isso, caro leitor, da próxima vez que olhar para o relógio, não pense apenas no compromisso que vem a seguir, no prazo a cumprir, na conta a pagar. Pense nisto: você ainda tem tempo. Talvez o suficiente para dizer "eu te amo", para abraçar com vontade, para plantar uma árvore que outros colherão os frutos. O relógio não para, mas enquanto ele se move, você ainda está no jogo. 

E quando chegar a hora — porque ela chegará para todos —, que o seu relógio não marque apenas horas vazias, mas histórias bem vividas. Que ele não conte apenas minutos, mas momentos. E que, no fim, quando o tique-taque silenciar, alguém olhe para o seu legado e diga: "Ah, como essa vida valeu a pena." 

Sorria. O tempo passa, mas a vida é agora, neste instante. Viva!

 

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