Zé Luiz
SIRIEMA
Um animal na
pista. De longe, avisto o movimento de uma ave de médio porte, pernas longas e
finas, afastando-se do centro da via para o acostamento. Observo que havia
penas e outra ave caída no asfalto. Passo, desviando, e olho pelo retrovisor a
sobrevivente retornando próximo ao corpo da companheira e ali, ergue a
cabeça, fazendo gestos de estar emitindo sons e grunhidos.
As siriemas
são aves comuns do cerrado. Andam sempre em casais e possuem uma ligação muito
forte entre si. A dor aparente sentida pela siriema impactou minha viagem.
Coisas assim me fazem refletir. A gente se une tão fortemente com a pessoa com
quem escolhemos viver que consigo dimensionar o suposto sofrimento daquele animal.
Há um elo que nos une que parece inquebrável, tal a cumplicidade, o apego e a
entrega. É tão forte esse vínculo que o entendimento passa a se dar pelo olhar,
o sentimento é visceral, é notório e evidente.
É um desejo
de estar junto, de fazer tudo junto, de sonhar junto, de crescer, sofrer,
sorrir, viver junto. As décadas vão passando e isso não diminui; pelo
contrário, ganha dimensões ainda mais vívidas, a corrente fortalece, o
mutualismo se expande. A beleza ganha contornos diferentes do que a juventude
nos fazia enxergar. Há coisas que ninguém faria igual por mim, nem melhor.
Tolerar, compreender, cooperar. Tudo completa um quadro pintado a duras penas,
forjado muitas vezes sob a égide da dor, da lágrima. O alerta, o puxão de
orelhas, o sinal de que os ânimos precisam ser contidos, sempre vieram na hora
oportuna. O silêncio teve dias que falou muito mais alto que os impropérios de
palavras soltas e vazias. Há a identificação do momento, do respeito, do olhar
sem pressa, do cafuné que diz muito mais que sermões inflamados. A brevidade da
vida, e uma pretendida experiência, me fizeram dar valor aos pequenos detalhes,
ao que definitivamente fazem a vida valer a pena.
É isso aí!
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