Zé Luiz

11:25 José Luiz 0 Comments



SIRIEMA


Um animal na pista. De longe, avisto o movimento de uma ave de médio porte, pernas longas e finas, afastando-se do centro da via para o acostamento. Observo que havia penas e outra ave caída no asfalto. Passo, desviando, e olho pelo retrovisor a sobrevivente retornando próximo ao corpo da companheira e ali, ergue a cabeça, fazendo gestos de estar emitindo sons e grunhidos.

As siriemas são aves comuns do cerrado. Andam sempre em casais e possuem uma ligação muito forte entre si. A dor aparente sentida pela siriema impactou minha viagem. Coisas assim me fazem refletir. A gente se une tão fortemente com a pessoa com quem escolhemos viver que consigo dimensionar o suposto sofrimento daquele animal. Há um elo que nos une que parece inquebrável, tal a cumplicidade, o apego e a entrega. É tão forte esse vínculo que o entendimento passa a se dar pelo olhar, o sentimento é visceral, é notório e evidente.

É um desejo de estar junto, de fazer tudo junto, de sonhar junto, de crescer, sofrer, sorrir, viver junto. As décadas vão passando e isso não diminui; pelo contrário, ganha dimensões ainda mais vívidas, a corrente fortalece, o mutualismo se expande. A beleza ganha contornos diferentes do que a juventude nos fazia enxergar. Há coisas que ninguém faria igual por mim, nem melhor. Tolerar, compreender, cooperar. Tudo completa um quadro pintado a duras penas, forjado muitas vezes sob a égide da dor, da lágrima. O alerta, o puxão de orelhas, o sinal de que os ânimos precisam ser contidos, sempre vieram na hora oportuna. O silêncio teve dias que falou muito mais alto que os impropérios de palavras soltas e vazias. Há a identificação do momento, do respeito, do olhar sem pressa, do cafuné que diz muito mais que sermões inflamados. A brevidade da vida, e uma pretendida experiência, me fizeram dar valor aos pequenos detalhes, ao que definitivamente fazem a vida valer a pena.

É isso aí!

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