José Luiz
VIVENDO
Ele chega meio desconfiado, como se não quisesse perturbar, com receio de estar incomodando. Senta-se ao lado, puxa uma conversa tímida, fala do tempo e outros assuntos corriqueiros. Quando percebe que há uma recíproca, com seu cabelo prateado, sua voz rouca e mansa, seu sorriso vivo, vai contando suas experiências do passado, de um tempo em que as coisas tinham outra dinâmica. Não é tão saudosista como os anciões que encontramos por aí, que vivem a lamentar a nova era e inflam de elogios os tempos idos. Não! Ele acredita que muita coisa boa veio para melhorar a vida da gente. Sempre cita a medicina, os meios de comunicação e os transportes como exemplos. Fala, do alto de sua coluna curvada, que hoje se vive bem melhor, apesar do comportamento estranho de muitas pessoas.
Ao longo dos anos, adquiriu uma sensibilidade própria e um jeito peculiar de analisar o mundo. Faz questão de dizer que já foi cheio de marra e teimosia, mas que agora compreende melhor os outros e suas manias. Diz, com satisfação, que consertou muitos defeitos seus, apesar de ainda ter alguns que precisam de reparos. É temente a Deus e vive a agradecer, segundo ele, o pouquinho de saúde que ainda tem: o suficiente para cuidar de suas obrigações e ficar inventando umas coisinhas para fazer. Conta que já viveu muitas aventuras e infortúnios, sofreu quedas e alcançou vitórias, mas que, depois dos filhos todos criados, não é preciso tanta pressa. Vê-se que gosta mesmo é de prosear, jogar truco na mesa de cimento da praça e assistir jogos de futebol, pois sabe de cor a tabela do campeonato. Outra coisa que aprecia muito é acompanhar a política pela TV Senado. Lê os jornais da semana e ouve atentamente as notícias locais pelo rádio, na hora do almoço. Juntos com os remédios que toma diariamente, essas coisas colaboram na sua vitalidade.
Fico feliz quando o vejo chegando. Não tem problema se tenho tarefas a cumprir, deixo-as suspensas por um tempo. Ele merece cada segundo dedicado. Quem ganha mais sou eu, que tenho o privilégio de usufruir de suas doses fartas de sabedoria e generosidade. Como são bacanas nossos velhinhos! Todos nós, se assim o Criador permitir, chegaremos lá um dia. Espero, quando este tempo chegar, encontrar gente que também me dedique um pouco de atenção.
É isso aí!
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