José Luiz
TRAVESSIA
O mestre do neologismo, criação de novas palavras, Guimarães Rosa, escreveu que a beleza não está na partida, nem na chegada, mas na travessia. É na travessia que se constroem os laços, desnudam-se os seres, caem as máscaras, vestem-se outras. É na travessia que nos amamos, criamos filhos, arranjamos problemas para poder encontrar solução, quando é possível. O bom da vida é justamente viver. Isso porque viver exige coletividade, senso de companheirismo, dividir espaços e tempos. Nascer e morrer é tudo numa solidão danada. Faz-se essas coisas sozinho e elas passam rápido. Já o ato de viver se desdobra lentamente, com a companhia de tanta gente.
No grande emaranhado do universo, cada coisa ocupa seu devido canto. Num caos organizado, psicótico e paradoxal, vamos desenrolando nossos novelos sem fazer novela, porque viver é real demais para fingimentos e falsidades. Não se consegue fazer tipo durante muito tempo. Logo, logo, a verdade prevalece, tal qual a relação professor-aluno. Todo mundo se conhece. Identificam-se pelo sorriso, pela ironia, pelas tristezinhas, pelos esbravejamentos, por qualquer manifestação emotiva. Somos o que nossa emoção deixa transparecer. Não há como se enganar. O contato é intenso demais.
Que não nos percamos nas perdas, nem nos desviemos do que realmente somos nas grandes vitórias. Colhamos flores na travessia, frutos das sementes um dia lançadas. Sejamos de fato responsáveis pelas coisas que cativamos, como sugere Exupéry. E nessa simbiose chamada vida, não sejamos escravos dos vícios, da ambição e do dinheiro, porque eles nos tornam seres menores. E gente foi feita para brilhar, já dizia mestre Caetano.
É isso aí!
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