CRÔNICAS DO COTIDIANO DE UM PROFESSOR - AULA DE INGLÊS

11:58 Professor José Luiz 0 Comments


 

Certa vez, em uma de minhas aulas de Inglês, estávamos interpretando a canção Imagine, do ex-Beatle John Lennon. Além da tradução, buscávamos compreender as nuances da língua, identificando adjetivos, substantivos e elementos de conexão do texto. Como um tempero essencial, analisávamos também a mensagem transmitida pela letra.

A aula acontecia em uma turma de 6º Ano do Ensino Fundamental, a antiga 5ª série, etapa escolar temida por muitos educadores devido à fase peculiar dos alunos, que transitam da infância para um mundo novo, repleto de mudanças psicológicas, físicas e sociais.

Ao término da canção, um pequeno estudante—menino esperto, atento, negro, de 11 anos, ergueu a mão, ansioso para fazer uma pergunta. Concedi-lhe a palavra e ele me questionou:

— Professor, tenho um sonho. Amo Inglês e quero, um dia, me tornar tradutor. Será que consigo?

Ao enxergar, naqueles olhos miúdos e brilhantes, uma imensidão de sonhos, respondi com firmeza que sim, ele conseguiria. Mas ressaltei que as conquistas, para nós, vinham através de muito esforço, suor e lágrimas. Ele era parte de uma família com dez irmãos, vivendo em uma situação financeira extremamente precária, a ponto de, em algumas ocasiões, funcionários da escola se unirem para montar uma cesta básica e ajudá-los a enfrentar a fome.

Disse-lhe que, apesar das dificuldades, ele alcançaria essa vitória e se tornaria uma inspiração para seus irmãos, que veriam nele a prova de que também poderiam realizar seus sonhos. Reforcei que deveria estudar com afinco e colocar essa meta como prioridade em sua vida. Acrescentei ainda que, quando estivesse prestes a receber seu diploma, me enviasse um convite, para que, se possível, eu estivesse lá, na plateia, aplaudindo sua conquista. Ele sorriu, os olhos ainda mais brilhantes, e se aquietou em sua carteira.

Foi então que outra aluna ergueu o braço. Lembro-me bem dela: uma menina pequena - herdando os traços genéticos de sua família, de personalidade ímpar e olhar vivo. No alto de sua pouca estatura, perguntou se poderia comentar algo sobre minha conversa com o colega.

Consenti com um aceno de cabeça, e ela, com a convicção de quem carrega um pensamento sincero, disse:

— Professor, o senhor não deu uma aula de Inglês.

Por um instante, fiquei surpreso. Confesso que temi o que viria a seguir, pois me pareceu que aquela garotinha estava prestes a me chamar a atenção por não ter dedicado o tempo da aula ao ensino formal da matéria.

Mas, então, veio a frase que aquece meu coração até hoje:

— O senhor deu uma aula de AMOR.

Sempre me emociono ao recordar esse episódio, seja em palestras, seja em conversas casuais. Esse momento me faz acreditar que segui o caminho certo, pois, para mim, educação que não toca a alma das pessoas não tem valor algum.

Mais do que conteúdos programáticos, o que realmente importa são as marcas que deixamos nesses jovens, seres sedentos por conhecimento e ávidos por alguém que lhes mostre um caminho. Pessoas que, assim, podem se tornar mais felizes, donas de si, preparadas para enfrentar essa jornada dura e fascinante chamada vida.

 

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