Mãe
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Ela chegava de
mansinho, como quem não queria nada, alisava meus cabelos e pedia com afeto
angelical para que fosse até a “venda” chamar o pai para almoçar. O cheiro se espalhava
pela casa inteira. Depois da filharada se juntar toda em volta da mesa, ligava
seu radinho e ouvia a voz carinhosa tão peculiar nos locutores de AM. Logo, às
duas da tarde, todo mundo se ajuntava para ouvir a leitura de uma carta enviada
por algum ouvinte que tinha uma bela história para repartir. Não foram raras as
vezes que vi minha mãe secando as lágrimas, meio disfarçando, no avental branco
que a acompanhava sempre.
Alegria era
quando percebia a movimentação de que haveria biscoito frito. É... a vida é boa
porque ainda tem biscoito frito! O café recém saído do fogo, fumegando e esparramando
aroma para a vizinhança. Era o tempo de todo mundo se alegrar. E quando chovia,
telhas comuns, dessas bem antigas, deixavam frestas o suficiente para vazar as
goteiras, e, nas tempestades de granizo, as pedrinhas de gelo espatifavam no
chão. Todos corriam para o quarto deles e ficávamos disputando um colo que
certamente abrigaria o universo. O amor era palpável, tangível, dava para
sentir a consistência, a textura.
Quando
estudávamos fora e íamos passar o fim de semana em casa, ela, na despedida,
entregava-nos um conjunto de moedas que havia juntado durante os dias da
semana, dizendo que era para não passarmos vontade de comer algo. Formamos.
Viramos homens e mulheres de bem. Pelo menos, tentamos muito ser tudo aquilo
que um dia sonharam para nós. Minha mãe se foi cedo. Tinha pouco mais de
sessenta. Mas, a intensidade do tempo em que tivemos o privilégio de tê-la
conosco serviu para compreender a essência das palavras ternura, caridade e
amor.
É isso aí!
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