José Luiz
COLCHA DE RETALHOS
Qual será a causa de tamanha dificuldade em aceitar
as pessoas que pensam diferente da gente? No meu trabalho, tudo deve acontecer
do exato modo que penso; na família, só admito as falas que me agradam; na
minha igreja, quero uma particular, do meu jeito. Crio um mundo onde só caiba o
meu umbigo descomunal, onde todos os planetas orbitam no seu entorno.
Não acho que tenhamos de ser coniventes com tudo e
aceitar as coisas que dão de testa com nossos princípios, mas o respeito ao modus vivendi de cada ser deve ser
preservado. Que me desculpem os demasiadamente corretos, mas tenho uma
predileção pelos que gostam do risco, pelos que fazem da vida uma aventura,
pelos que gostam de colorir o planeta. É bom andar com a roupa toda engomadinha,
com o bigode aparadinho, com o sapato sempre engraxado, com o cabelo
irretocável, mas fazer destas coisas o pilar que sustenta uma existência é
sofrimento demais. O bom mesmo é rir com as crianças, comer algodão doce, andar
de pé descalço, escrever nulidades, ver filmes de ficção, ler livros que dão
prazer. E isso só pode ser feito se formos despojados desta coluna ereta em
demasia, que nos impede de qualquer tentativa de dobramento. Não somos estátuas
incólumes, impávidos colossos, desprovidos de qualquer sentimento ou maleabilidade,
feito quem engole uma alavanca. Somos gente. E o rico em ser gente é esse poder
de superar, de viver as diferenças, a multiplicidade humana, o grande festival
de cores e formas que compõem o quadro da humanidade.
Cada qual do seu jeito se alinha, se encaixa, no
tecido da vida. Viver bem é discordar do que o outro diz e mesmo assim
admirá-lo pela intensidade de seu discurso, pela paixão com que movimenta suas
ideias e ideais. Viver bem é, ainda, concordar com o outro, aplaudir seus
feitos e palavras, sabendo peremptoriamente que um dia esta pessoa vai
demonstrar sua humanidade da maneira mais trivial: falhando. E assim mesmo,
continuar admirando e respeitando. Viva a colcha de retalhos que se disfarça de
vida!
É isso aí!
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