José Luiz

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O PÉ DE MEXERICA

Lembro-me bem daquele pé de mexerica. Ficava ao lado de um abacateiro, grudado num pé de laranja ressequido. Era ali, que me escondia do mundo para brincar de fantasia. Aquele tanto de gente lá em casa, não dava para se isolar muito não. O armazém do meu pai, na esquina da praça ainda sem bancos, nem jardins, só povoada de árvores e pássaros e meninos e igreja, vendia de tudo. Tinha fumo de corda, corda de sizal, dobradiça de porteira, parafusos e pregos de todas as espécies, chapéu de palha, feijão e açúcar a granel, sorvete, cachaça, e uma banquinha de revistas. Foi em meio a tantas histórias em quadrinhos que me fiz leitor contumaz. Pegava escondido os gibis e corria para debaixo do pé de mexerica para me deliciar com as frutas e os personagens tão queridos, colados na minha alma de menino até os dias de hoje.

Dali, comecei a me interessar por outros tipos de leitura, devorava os jornais, amava as revistas e palavras cruzadas. Aos livros, fui apresentado bem depois. Mas, chegaram em tempo de me prender e me levarem pelos rumos ditados pelos romances picantes de Jorge Amado, pela genialidade de Machado de Assis, pela inteligência caipira de Guimarães Rosa, pelos versos sólidos de João Cabral e pela múltiplas faces de Drummond. Naquele tempo, meu pai achava que ler gibi era total perda de tempo, coisa de gente que não tinha o que fazer. No alto de sua rusticidade serena, compreendia que naquelas histórias não tinha muito o que tirar de proveito. Hoje, já com o fardo dos anos no dorso, admite que não ganhou muito dinheiro com as revistas, mas foi presenteado no futuro com uma geração de leitores, surgidas na sombra de uma árvore, no terreiro de sua casa de telha comum. A vida é assim: tão simples, tão singular e tão universal. Tenho certeza que você tem muitas destas para contar também.

É isso aí!

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