O CIRCO

12:07 José Luiz 0 Comments

O circo está vazio. São nove da noite, é sábado, nenhum movimento. As luzes apagadas. Apenas a penumbra e uma luz fraca, destas comuns, de brilho alaranjado, lá no fundo do picadeiro. Uma silhueta se forma na lona já gasta, um homem sentado com a cadeira no meio das pernas. Sem que perceba minha presença, fico a observar aquele semblante entristecido. Sem pinturas no rosto, o velho palhaço chora. O circo não era o mesmo, a força da TV e da Internet havia tirado um pouco da força mágica dos espetáculos. Há tempos rareava o número de gente para vir assistir. Mesmo assim, insistia no sonho. Agora, sumiu tudo de vez. Não tem criança para dar gargalhadas, nem os engraçadinhos que sempre querem chamar mais a atenção que os artistas. O vírus espantou todo mundo. Até por força da lei, não podem mais trabalhar.

A cada lágrima que rola naquela face cansada, vejo o lamento de quem depende da bilheteria para subsistir, para ter o que comer. Ele e tanta gente ali naquela terra dos sonhos, palco das fantasias, seara das doces ilusões. E amanhã, o que fará? Não o perturba tanto a mente a qualidade das apresentações, se o palhaço estará engraçado, se o malabarista não vai falhar, se as dançarinas estão bem ensaiadas. O que faz aquecer os miolos é a preocupação com o que fazer para alimentar tantas bocas que nesta hora tentam se acomodar em seus apertados trailers. Não tem dinheiro para pagar os salários, nem as comissões e nem tem de onde tirar. Persiste nesta loucura de manter em pé esta ideia fixa, de permanecer aberto o devaneio do circo que vem há quase um século mantido pela família.

O Decreto veio na véspera da estreia. Estava tudo prontinho. Não deu! E agora, espera voltar ao normal ou abaixa as tendas e volta não sabe para onde, se o mundo inteiro parou? Escolheu esperar. A esperança é o combustível que mantém vivo o sonho desta gente. Só precisará mudar o nome do Circo. Mesmo que a família carregue com orgulho esta marca, não dá pra ter nome de um vírus tão implacável nas placas iluminadas. Mais um prejuízo.

Vou me distanciando, sem fazer barulho e sem conseguir segurar, uma lágrima teimosa cai junto. Uma desilusão silenciosa, um certo desencanto cedeu lugar ao barulho e a diversão dos pequenos. Mas, parece que ouço uma voz grossa dizendo, tendo ao fundo o som de O Milionário, na guitarra de timbre inconfundível dos Incríveis, dizendo: “Respeitável público, o espetáculo voltou! É hora de ser feliz!”

É isso aí!

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